How to Save a Life
Sabem aqueles momentos críticos nas séries de médicos em que entra alguém no hospital com um objecto estranho preso na garganta e é preciso fazer uma traqueostomia ali mesmo no corredor a sangue frio ou com uma artéria femoral a jorrar sangue que é necessário ligar de imediato? Nós, veterinários, praticamente não temos momentos desses. Poucos são os episódios após os quais possamos comentar "se não estivesse lá naqueles dez segundos, o animal tinha morrido".
De vez em quando lá vem um que decide fazer uma paragem cardiorespiratória à nossa frente e aí sim, é um desses poucos momentos. Mas se a taxa de reanimação bem sucedida em medicina humana é já inferior a 25%, querem imaginar um número para os animais? Menos de um em dez. E eu ontem tive esse um. Ou pelo menos assim acreditei durante alguns minutos.
O cão entra com um problema cardíaco tão grave que já está a cuspir água pela boca. A auscultação pulmonar faz-me lembrar as ondas da praia. A barriga é uma bola de futebol também ela cheia de água. Diurético e jaula de oxigénio. Dois minutos depois, o cão cai para o lado. E eu vejo todas essas imagens dos filmes a passarem pela minha cabeça. A enfermeira tira-o da jaula e vira-o de cabeça para baixo, só para observarmos meio litro de água a sair directamente dos pulmões. A língua começa a ficar roxa e o pulso fraco. É hora da massagem cardíaca. As costelas partem sob o peso do meu corpo e isso significa que estou a usar a força necessária. Quem quer saber de costelas partidas depois de ser reanimado com sucesso? Faço pausas regulares para auscultar com atenção o batimento cardíaco enquanto a minha enfermeira se ocupa da oxigenação. E como por milagre, o cão recupera. Primeiro melhora a respiração, depois o coração começa a bater de uma forma regular e por fim levanta a cabeça várias vezes para mudar de posição.
Passam dez minutos e eu pergunto-me "quanto tempo mais lhe terei dado?". E lá volta a língua a mudar de cor, a respiração entrecortada e difícil a entrar em acção e o ritmo cardíaco a dançar depois de beber duas garrafas de vodka. Volta tudo ao início e eu já sei que à segunda as coisas vão ser diferentes. Hora da morte - 13h50. O coração não aguentou.
Ligo ao proprietário. Quando lhe anunciei que o prognóstico era muito grave no momento da hospitalização, já lia nos seus olhos que era a última vez que via o seu companheiro de quatro patas. Mas nunca ninguém está preparado. Anuncio a morte com uma voz calma e pausada. Ele chora. Desligo e também eu choro. Ainda bem que a enfermeira foi almoçar. Escrevo o relatório em lágrimas. Foi o meu milagre durante escassos minutos. Sei bem que o caso era muito grave e que fiz tudo ao meu alcance. Mas à vezes não dá para evitar pensar para que raio serve tudo isto se no fim o resultado é o mesmo para todos nós - a morte.