Eu Mesma
Há momentos assim. Depois passam.
Às vezes penso que não pertenço a este planeta, que cheguei aqui por engano e que seria melhor se nunca tivesse nascido. Sou assim uma coisa estranha, que está a meio entre um ser humano e um bicho, incapaz de se encaixar, de pertencer a algo, de fazer parte do que quer que seja. Um criatura fechada para o mundo, com graves défices sociais, que sonha um dia vir a ser uma pessoa normal, mas que não sabe como o fazer.
Condenada à solidão, entregue aos seus próprios pensamentos, que não se dá a conhecer. Toda a gente vê aquela miúda estranha que tira boas notas, que corre meias maratonas e que às vezes mete nojo de ser tão certinha. Mas mais profundamente do que isso, poucos suspeitam. Esta vergonha que tenho em ser assim, as lágrimas que tantas vezes me turvam os olhos por me achar mentalmente disforme, uma aberração, uma alma estropiada. O medo que tenho do futuro, por ser assim, anormalmente incapaz de comunicar com os outros, de me expressar. A mágoa de saber que me acham arrogante ou que têm pena de mim, sei lá. Sou eu o problema, sempre fui, desde que esta cabeça que não esquece se recorda de existir. O maior entrave à minha felicidade plena, sou eu mesma.