Partir
Deveria ficar mais fácil mas parece que só fica mais difícil à medida que o tempo passa. E o espaço entre cada regresso também se torna maior e maior, até se assemelhar a um buraco negro sem fim. Primeiro eram dois meses, depois três, agora serão cinco ou seis. Escolha minha, que preferi gastar as férias de Setembro na Ásia em vez de regressar a casa. Escolha minha, que decidi prolongar o contrato por mais um mês e meio. Não me arrependo. Mas o coração vem sempre apertadinho no avião, a pensar que seis meses em anos de cão equivale a uns quatro anos. A pensar que pode ter sido o último abraço que dei ao meu avô. Que é possível que em Março tenha visto a minha avó pela última vez. Que tenho uma pessoa maravilhosa à espera impacientemente pelo meu regresso. Que nunca se sabe o dia de amanhã.
Regressar a casa vem sempre com o pressuposto de partir a seguir, eu sei. Mas uma pessoa pode habituar-se às filas de espera no aeroporto, aprender a distrair-se durante o voo, saber de cor as paragens do autocarro que faz o trajecto Nice Cannes mas nunca se habitua à tristeza que é ver Lisboa a ficar para trás - e com ela tudo o que me é mais querido, claro está - à medida que o avião rompe as nuvens. As lágrimas que derramou não se convencem. Partir só fica mais difícil a cada regresso.